segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Carta ao pai


Pai,
recentemente você demonstrou certa preocupação com minha saúde mental. Alegou que eu andava bebendo demais e gastava todo meu dinheiro com o álcool.

Engraçado, não lembro de ter conversado com você recentemente. (Será o efeito do álcool?)
Na verdade, as coisas que você anda falando sobre mim, ouvi de terceiros.

Pai,
eu sei que você tem medo. Que quer o melhor pra mim.

Eu sei que você teme pelo meu futuro.
E teme que eu me torne um homem fracassado e passe a vida sendo sustentado pelos outros.
Você teme, talvez, que eu faça vários filhos e não cuide de nenhum.
Você teme que eu me entregue às drogas e talvez num domingo de sol leve meu filho mais novo morro acima pra comprar crack comigo,
e teme também que eu suma um dia antes do aniversário dele e reapareça vários dias depois, sem presente, sem explicação, sem coragem de olhar no olho.

(Você teme que eu seja um covarde.)

Eu sei: você não quer que eu me torne um velho amargo,
que nunca fez nada útil com a própria vida;
que se considera um gênio, mas na verdade é um racista conservador e preguiçoso que passa o dia em frente à televisão remoendo ilusões.
Que parou no tempo e vive do mesmo repertório.
As mesmas piadas, os mesmos temas e argumentos...

Eu sei. Você teme.
Você quer o melhor pra mim.

Mas,

Pai,
fica tranquilo.
Eu jamais me tornarei essa pessoa.

Sabe, eu aprendi muito com você.
E você se tornou um exemplo pra mim:

Um exemplo do que não ser.
Um exemplo do que não ser.
Um exemplo do que não ser.
Um exemplo do que não ser.
Um exemplo do que não ser.


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