segunda-feira, 11 de julho de 2016

não é só isso



não é só isso, amigo.

é já ter compreendido o filósofo,
é saber destrinchar uma intenção
perfeitamente,
é não encontrar dificuldades em levar uma mulher à cama e
conseguir prever todas as palavras que sairão daquela boca vil
e ser ídolo, ser exemplo…

é estar vivo, com pernas que funcionam e dedos que apontam,
é ter rompido a placenta e ainda assim não compreender
nada
quando ela sai pela porta levando sua toalha e
todas as outras coisas que me faziam companhia em
noites como essa.

sua bicicleta atravancando a cozinha tinha até conquistado seu espaço
e parecia não mais atrapalhar,
aliás,
já fazia parte da minha mobília precária.

sua vermelha toalha pendurada como uma cortina de sublime tecido.
seus cabelos como água-viva espalhados por toda a casa…

bem, ainda tenho o filósofo, a cama, a boca
e palavras que me salvam em
noites como essa
onde já sei tudo e conquistei tudo
mas pareço um leproso ao espelho.

nessas noites de vinte e quatro horas e cupins.
nessas noites de comprimidos.
noites de faca afiada, de martírio, auto-piedade,
noites que se parecem em muito com noites.

noites de tuberculose.
aneurismas.

de culta incompreensão dos fatos,
de sábias palavras inúteis,
de podres metáforas pedantes,
noites de úmido frio e insônia.

noites sem ela ali,
desfilando sua nudez a meu deleite
enquanto me espalho pela cama sentindo esse breve amor
que uma toalha vermelha

é capaz de enxugar




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inverno, 2012,                                                                                              
São Paulo/SP                                                                                                

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