Hoje tem visita, mas a velha não
se importa. Não se importa porque já não mais distingue a visita, que é a filha
mais nova.
Há cinco anos que a velha já não
é dona da própria razão. Há cinco anos a velha pronuncia, clamando, o mesmo
nome:
Osvaldo.
O nome Osvaldo tornou-se símbolo
de desespero na casa. Desespero da velha moribunda a quem parece necessitar
Osvaldo; desespero do bisneto que mal teve contato com a velha e que não tem
paciência para com as lamúrias. Desespero da filha mais velha da velha, que é
obrigada a suportar tudo isso; que cuida da mãe vegetal como cuidou dos filhos
que morreram cedo; que cuida da mãe como a mãe um dia cuidou dela, e revida na
mãe vegetal os maus tratos que recebeu.
- Quem é
esse tal de Osvaldo que a mamãe tá chamando?
- Eu não
sei, Terezinha, quando eu não dou o remédio e ela fica agitada, só sabe falar
esse nome. Ela nunca me falou de nenhum Osvaldo. O papai também não.
- De certo
deve ter sido algum namorado que ela teve na juventude.
A neta da velha – filha da filha
mais nova – vem subindo as escadas com o bolo. É aniversário da velha. 96 anos.
Da escada é possível sentir o cheiro de urina e fezes que o quarto emana. A
neta quase vomita. Para, respira devagar, fecha os olhos, se concentra e segue
até o quarto, ao final do corredor, onde estão sua tia, sua mãe e a velha.
“As crianças devem estar
chegando”, diz a neta.
A neta tem 46 anos. Dois filhos;
um garoto e uma garota que chegam após 12 minutos.
“To aqui em cima”, grita a neta
para os filhos, que sobem as escadas contra a vontade, mas não questionam. No
caminho, quase vomitam. Param, respiram devagar, fecham os olhos, se concentram
e seguem até o quarto, ao final do corredor, onde estão a velha, a avó, a tia-avó
e a mãe. Param na porta.
O parabéns é tímido e constrangido e a velha só faz soar “Osvaldo,
Osvaldo...”
“Quem é Osvaldo?”, pergunta a
neta.
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