sábado, 26 de abril de 2014
Industrial
Querendo fugir desse apartamento
que me confina,
olho pela janela e não vejo vida.
Compreendo: a vida é anti, mas também sua ausência.
Um alvorecer vermelho áspero industrial revela o inevitável:
carros
que esperam vazios seus dependentes
(alguns já enfrentam mais um dia),
trilhos prontos pra carga humana,
altos prédios em blocos-cinza,
Muros
construções embargadas, guaritas vazias,
bancos vazios na estação...
Em qual lugar,
em qual refúgio terreno esconde-se a vida?
Sob qual luz,
sob qual luz que não seja essa –
opaca e leitosa –
revela-se o milagre?
,meu peito vazio
se contorce
sem luz.
Meu peito sem leite pulsa e não ecoa.
Pelas minhas veias corre o ferro
o chumbo
metais pesados e leves
presentes nessa paisagem industrial que me brinda em todas as manhãs que encaro o dia.
Compreendo: também a ausência é vida.
Também o ferro moldado é vida.
Também o vazio é vida.
Compreendo: mesmo a espera é vida.
Querendo fugir desse apartamento
triste que me confina,
olho pela janela outra vez e compreendo:
viver dói.
(Vida essa amputada e nunca plena.)
E mesmo o amar não é pleno –
exige vigília e na vigília torna-se câncer.
Vem comigo...
Ao menos na minha fantasia, sejamos plenos.
Ainda que nas promessas, sejamos plenos.
Ainda que nos poemas, sejamos plenos.
Porque a vida não basta.
Tento outra vez, falho
e volto.
Volto e me refugio nesse poema interrompido
e impotente.
São Paulo, outubro de 2013
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