Emanuel
Filho é homem honesto, incapaz de cometer um mínimo ato imoral. Ama, acima de
tudo (e até acima de Deus), sua mãe Juracir, mulher guerreira e ignorante – esse fato Emanuel ignora.
Aos 46 anos,
Emanuel Filho atingiu o ápice da carreira profissional, tornando-se
zelador do Edifício Residencial Paineiras. E conseguiu, finalmente, após árduo
trabalho honesto, presentear sua mãe com um novo sofá; afinal, pensava Emanuel,
aquela mulher batalhadora merecia (como ninguém) repousar em paz.
O cubículo
ao lado do bicicletário C-2 era suficiente para a vida e poucos pertences de Emanuel
Filho. Homem discreto e passivo, não recebia visitas; seu único vínculo social
era justamente com Dona Juracir, a quem visitava quinzenalmente, nas folgas.
Ao não
perceber que sua humildade havia se tornado submissão, Emanuel Filho pedia
licença como quem pede desculpa ao entrar na casa da mãe, que – viúva e silenciosamente envergonhada
pela vida do filho – recebia-o
sempre com certa impaciência e aflição.
– Já tá ficando tarde, Filho, é melhor
você ir indo antes que escurece.
Ainda é capaz de pegar um resfriado andando por aí.
E Emanuel,
46 anos, assentia, julgando ingenuamente aquilo como nobre preocupação
materna.
– Eu te amo tanto, mãezinha. No dia
que a senhora se for, não sei nem o que vai ser de mim. – gemia, abraçando-a de modo dramático.
Até que
certo domingo, dia de visita, a vital questão de Emanuel Filho foi posta à
prova.
Juracir não
atendeu a campainha (por sinal, sempre tocada com muito zelo, inofensivamente,
quase imperceptível). E não atendeu porque enamorou-se e foi morar na casa de
Dorival, parceiro de dança aos sábados, parceiro secreto de paixão operária há
três anos.
No portão
humilde da casa (grande demais para uma só pessoa) era possível notar a placa
formal: "ALUGA-SE", e o número da imobiliária. Do lado de fora, na
calçada, alguns móveis velhos já castigados pela chuva, quadros sem moldura, um
fogão... e o sofá – aquele;
escolhido com tanto cuidado.
Nenhum
bilhete. Nenhum aviso. Nenhum sinal.
Emanuel
Filho sentou-se no encosto do sofá abandonado, tentando compreender.
maravilha, maravilha!
ResponderExcluirde uma ironia bastante refinada! muito bom...
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