não é só isso, amigo.
é já ter compreendido o filósofo,
é saber destrinchar uma intenção
perfeitamente,
é não encontrar dificuldades em levar uma mulher à cama e
conseguir prever todas as palavras que sairão daquela
boca vil
e ser ídolo, ser exemplo…
é estar vivo, com pernas que funcionam e dedos que
apontam,
é ter rompido a placenta e ainda assim não compreender
nada
quando ela sai pela porta levando sua toalha e
todas as outras coisas que me faziam companhia em
noites como essa.
sua bicicleta atravancando a cozinha tinha até
conquistado seu espaço
e parecia não mais atrapalhar,
aliás,
já fazia parte da minha mobília precária.
sua vermelha toalha pendurada como uma cortina de sublime
tecido.
seus cabelos como água-viva espalhados por toda a casa…
bem, ainda tenho o filósofo, a cama, a boca
e palavras que me salvam em
noites como essa
onde já sei tudo e conquistei tudo
mas pareço um leproso ao espelho.
nessas noites de vinte e quatro horas e cupins.
nessas noites de comprimidos.
noites de faca afiada, de martírio, auto-piedade,
noites que se parecem em muito com noites.
noites de tuberculose.
aneurismas.
de culta incompreensão dos fatos,
de sábias palavras inúteis,
de podres metáforas pedantes,
noites de úmido frio e insônia.
noites sem ela ali,
desfilando sua nudez a meu deleite
enquanto me espalho pela cama sentindo esse breve amor
que uma toalha vermelha
é capaz de enxugar
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inverno, 2012,
São Paulo/SP
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