terça-feira, 11 de dezembro de 2012

a flor


do calmo desespero
nasceu uma flor escura de aspecto surreal
era o caos em sua essência que
rompeu contratos e lambeu quilômetros de
asfalto
essa flor tinha pétalas opacas realmente difíceis
de acreditar e
quando se viram numa praia de aparência
ainda mais surreal
feneceram
evidenciando o mais incrível terror
e se aquilo fosse um poema
seria só uma questão de ponto final mas 
do calmo desespero surgiam criaturas
tristes e curiosas e risonhas
copulando naquele quarto que não constava
e como não era ainda um poema
tentou-se de tudo para que a flor opaca
pudesse servir de rota
mas a flor  
regada a álcool e comprimidos
disse
“Fortaleça o caráter e tente outra vez”
o dia estranhamente durou 24 horas e
a noite durou uma vida mal vivida
e essa explosão – tal flor nasceu de uma explosão
trouxe alguns danos físicos mas o pior
foi o tempo de espera

hospital                                                            
                                  estômago
                                                               chão
rodoviária
                                           estrada                        
                      sexo

                                  afeto
solução                                               
                                      término              
        dívida   


   ponto final...

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

e no final, a burocracia


perder alguém 
é consenso: dói.

e o engraçado sobre isso é que
existe ainda outra etapa
que parece até mais cruel
e desgastante e absurda
que a morte em si
(afinal, absurda a morte não é)

bom seria confirmar a máxima
“e no final, a morte”
mas esta cai por terra quando surge
a burocracia.

quem vai pagar o velório?
quem vai avisar aos outros?
quem vai dar baixa em contas de bancos e cadastros?
quem vai colocar o sapato no pé do defunto, que inchou?

é como uma piada de mau gosto que alguns parentes insistem em contar
seja por nervosismo ou culpa
ou sentimento de obrigação em apaziguar o peso da morte.

e a papelada do inventário?
quem vai contar à criança?
quem vai lembrar das flores?
que fim dar aos objetos pessoais sem valor financeiro?
crema ou enterra?

confesso que comecei isso sem saber onde chegaria
e acabo de confirmar:
nossos costumes e rituais e procedimentos medíocres são indubitavelmente
muito mais cruéis do que a morte.

Brindemos!

lubrificante


as coisas iam bem
quando ela perguntou do lubrificante
eu disse que não sabia e ela disse procura
levantei do chão e fui até a cama procurar

“essa cama é tipo a bolsa do Gato Félix, você encontra de tudo aí!”, ela disse
achei aquilo genuinamente engraçado
e quando virei
e a olhei bem
totalmente nua e firme e pronta
quase ingênua e
um pouco louca, rindo bastante
pude descartar facilmente a idéia do sexo
mas era tarde. estávamos ali, devia ser feito
ainda mais porque eu estava agora
com o lubrificante na mão.

                nessa noite eu comi seu cu e
de manhã bem cedo ela se levantou e tomou banho enquanto eu fingia dormir
o sol ainda estava frio
e foi sob esse mesmo sol que eu a levei até o portão, de cueca
nos beijamos formalmente
então alguém acenou de dentro de um carro e eu retribuí
antes de perceber que era meu vizinho.

                quando entrei em casa pude ver seu brinco sobre o meu travesseiro,
premeditadamente.