segunda-feira, 29 de outubro de 2012

versos pedantes


farinha frita
com colher verde
dada
dadaísmo
dívida

ressaca
me perguntando o que aconteceu
ontem

arroz
poemas
põe mas
espera em
casa
quieto
entre uma colherada e outra

                                          outra
                                        outra
                                    outra
                               outra
                                  essa.

uma flor que nasce do cimento
como esse poema,
que nasce da farinha frita que
como de colher verde
dada
emprestada
esquecida
absurda como o céu
foda-se.

preciso ir pra rua
vou.

minha cabeça completa
de sangue pensa
versos pedantes
e diz
tchau.

domingo, 28 de outubro de 2012

A catraca


A catraca impede o ímpeto.

Incentivada, a catraca permite a passagem –
sensorial, digital, brusca – a catraca de mais um dia pode ser uma
conquista.

Pudemos notar isso da última vez em que nos vimos.
Nesse dia, nenhum dos dois cruzou a catraca.


um haikai


poemas poemar
avante!
pomar de satisfações.


Jogo

Fazíamos um tipo de jogo.
Uma sessão triangular de terapia psicanalista
onde éramos totalmente sinceros
ao expor a face escolhida para a noite.

Em algum momento ele me disse “cara,
para de projetar em mim o fato de você ser ruim de cama.”
Pensei em explicar que o ponto não era bem esse,
as mulheres fingem porque precisam fingir,
não era bem uma questão de ser ruim de cama,
mas ligeira ela lhe respondeu “ele não é ruim de cama.”
e meu amigo – que desconhecia o fato de já termos ido pra cama – se constrangeu.

Senti um certo orgulho quieto.
Mas podia isso também ser um fingimento –
uma tentativa de soar liberal…
Ponderei.
E quando o assunto sobre a infância virou em
mais uma via movimentada, meu amigo contou que, certa vez
ao fugir de casa, levou consigo apenas um dicionário, então
respondi, em tom profético:

O dicionário vai te dizer a mais desinteressante das verdades:
o significado das palavras

poemas



minha cabeça exaurida
vagueia entre um
e outro poema.
no caminho tropeça em mais um
(esse)

essa minha cabeça fraca
tonta
seca
que sorri com escárnio de superioridade quieta
trabalha
sim.

hoje o corpo não trabalha
folga

a cabeça então
está livre
bem, talvez não livre
mas quase.
e esse quase só me basta porque é o máximo que podemos conquistar
ante a liberdade

aliás, pouco me importa a liberdade.
liberdade é palavra.

minha cabeça que rosna
vagueia entre formigas e
mosquitos cômicos

tende a ser beat
e quando a propulsão a arremessa para o lado oposto
a mão bate teclas

não beats.
foi-se o tempo
foice o tempo.

tempo?
é palavra.

2x4


te abro a porta
te cedo teto
e cobertor
te poupo o sono
até mais tarde
te aqueço os pés
te entrego a chave
com tudo dentro
(levo comigo apenas o último que escrevi sobre você)
e quando volto
você não está
não deu notícia
(apenas um bilhete seco na maçaneta)
deixou a chave
a porta aberta
a louça suja
tudo desfeito
deixou papel
de mijo no chão
e avisou –
não volta hoje –
naquele bilhete
tom de telegrama
“a lanterna tá em cima da geladeira.
não lavei a louça.
até amanhã.”

e no amanhã você também não estava...

ali


ela estava ali pra ser qualquer uma
qualquer uma que eu quisesse que ela fosse
                ali

qualquer uma que não fosse ela mesma
ela estava ali para ser
                                 vir
  ando a esquina
                 não a encontro mais.


luto



o estilo enfim chega para aquele que está inseguro demais para ficar parado
mas a falta de estilo pode ser um estilo
e ficar parado também
de modo que é muito difícil reconhecer um farsante
– não para mim –
e os verdadeiros seguem comendo farinha de milho
e bebendo água turva
sem pilhas no relógio
ou
companhia
essa noite.
mas tudo bem,
porque eles podem aguentar isso
e muito mais
apenas não percebem.

é difícil recordar dos bons momentos.
aqueles realmente incríveis em que dizemos a nós mesmos
“é por isso que eu vivo! não se esqueça dessa sensação, ela sempre volta!”

é bem difícil.
sobretudo quando o telefone toca
e são eles

Kafka foi preciso quando disse que a família age 
como um agiota
emprestando a juros altíssimos
e –
acrescento –
são agiotas à moda antiga
capazes de quebrar membros e
fazê-lo engolir vidro moído
e toda essa coisa
brutal.

estou no terceiro round
e não sinto cheiro de vitória

meu adversário não me derrubará.
a questão é
contra quem eu luto?

um fato


o que determinou foi o tempo do seu sorriso.

ela só riu depois que passou,
ou seja:
riu de mim
não para mim.

bom,
era fato.
havia mesmo acabado.